Como já noticiado anteriormente, o Plenário
do Supremo Tribunal Federal iniciou julgamento de medida cautelar em ação
direta de inconstitucionalidade ajuizada em face do inciso II da Recomendação
Conjunta 1/2014 das Corregedorias dos Tribunais de Justiça e do Trabalho, e dos
Ministérios Públicos estadual e do Trabalho, todos do Estado de São Paulo; do
art. 1º, II, da Recomendação Conjunta 1/2014 dos Ministérios Públicos estadual
e do Trabalho, e das Corregedorias do Tribunal de Justiça e do Trabalho, todos
do Estado de Mato Grosso; do Ato do Gabinete da Presidência (GP) 19/2013 do TRT
da 2ª Região; e, finalmente, do Provimento do Gabinete da Presidência (GP)
7/2014, também do referido TRT, formalizado em conjunto com a respectiva
Corregedoria.
As normas impugnadas, em suma, atribuem
competência à Justiça do Trabalho para processar e apreciar pedidos de
autorização visando a participação de crianças e adolescentes em eventos de
natureza artística.
Fundamentos
O Ministro Marco Aurélio (relator) concedeu
a cautelar pleiteada, para suspender a eficácia da expressão “inclusive
artístico”, constante do inciso II da Recomendação Conjunta 1/14 e do art. 1º,
II, da Recomendação Conjunta 1/14, bem como para afastar a atribuição, definida
no Ato GP 19/2013 e no Provimento GP/CR 07/2014, quanto à apreciação de pedidos
de alvará visando a participação de crianças e adolescentes em representações
artísticas e a criação do juizado especial na Justiça do Trabalho, ficando
suspensos, por consequência, esses últimos preceitos, assentada a competência da justiça comum para analisar os referidos
pedidos.
Preliminarmente, o relator julgou cabível a
ação direta em comento. Afirmou que, não obstante o título de “recomendação”,
mediante os dois primeiros atos, de caráter geral e abstrato, teria sido
definida a atribuição de juízes trabalhistas acerca das aludidas autorizações.
Visto que oriundas de corregedorias, os juízes haveriam de observá-las.
Delimitara-se, portanto, com inegável
caráter cogente e vinculativo, a competência da Justiça do Trabalho no tocante
à matéria, que vinha sendo apreciada pela justiça estadual, particularmente,
pelos Juízos da Infância e da Juventude.
Esses atos, assim como aqueles por meio dos
quais fora criado e disciplinado o Juízo da Infância e da Juventude no âmbito
da Justiça especializada, teriam inovado no ordenamento jurídico, definindo-se
atribuição judiciária com fundamento direto nos incisos I e IX do artigo 114 da
CF. Cumpriram papel próprio de lei ordinária em sentido material, revelado,
assim, o caráter primário e autônomo dos dispositivos atacados, sendo viável a
ação direta.
No mérito, reputar-se-ia presente a
inconstitucionalidade formal e material das normas em questão. No que diz
respeito à inconstitucionalidade formal, reputou tratar-se de normas a versar
distribuição de competência jurisdicional e criação de juízo auxiliar da
infância e da juventude no âmbito da Justiça do Trabalho, que não foram
veiculados mediante lei ordinária.
Do disposto nos artigos 22, I, 113 e 114,
IX, da CF, depreender-se-ia estarem tais medidas sujeitas, inequivocamente, ao
princípio da legalidade estrita. Uma vez editados os aludidos atos infralegais
para fixar competência jurisdicional e criar órgão judicial, padeceriam de
inconstitucionalidade formal.
Relativamente à inconstitucionalidade
material, o relator ressaltou que, concretizando o comando do artigo 227 da CF,
o legislador ordinário, ao estabelecer o Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA), teria previsto a chamada “Justiça da Infância e da Juventude”. Teria
estabelecido que o Juiz da Infância e da Juventude seria a autoridade
judiciária responsável pelos processos de tutela integral dos menores, o qual,
apesar da especialização, pertenceria à justiça comum.
Tratar-se-ia de competência fixada em razão
da matéria, de caráter absoluto, e estabelecida em proveito da especial tutela
requerida pelo grupo de destinatários: crianças e adolescentes. Entre as
atribuições definidas, destacar-se-ia a de autorizar a participação de menores
em eventos artísticos, cuja possibilidade não fora excluída no ECA.
Ao contrário, seria observada como
importante aspecto do desenvolvimento dos menores, apenas condicionada, nos
termos do art. 149, II, do Estatuto, à autorização judicial a ser implementada
pelo Juízo da Infância e da Juventude, mediante a expedição de alvará
específico.
Os parâmetros a serem observados quando da
autorização, na forma do § 1º do referido dispositivo, evidenciariam a
inequívoca natureza cível da cognição desempenhada pelo juiz, ausente relação
de trabalho a ser julgada. A análise seria acerca das condições da
representação artística. O juiz deveria investigar se essas condições
atenderiam à exigência de proteção do melhor interesse do menor, contida no
art. 227 da CF.
O Juízo da Infância e da Juventude seria a
autoridade que reuniria os predicados e as capacidades institucionais
necessárias para a realização de exame de tamanha relevância e
responsabilidade.
Assim, o art. 114, I e IX, da CF, na redação
dada pela EC 45/2004, que estabelece a competência da Justiça do Trabalho, não
alcançaria os casos de pedido de autorização para participação de crianças e
adolescentes em eventos artísticos, ante a ausência de conflito atinente a
relação de trabalho.
Em seguida, em razão do pedido de vista da
Ministra Rosa Weber, o julgamento restou suspenso.