A Segunda Turma do Tribunal Superior do
Trabalho condenou empresa a manter o pagamento do auxílio-alimentação de um
empregado aposentado por invalidez em decorrência de neoplasia maligna
cerebral, nas mesmas condições dos trabalhadores em atividade. As instâncias
inferiores haviam julgado improcedente o pedido do trabalhador por não haver
previsão nesse sentido nas normas coletivas da categoria, concluindo que o
benefício seria devido apenas aos empregados da ativa.
Mas, para o relator do recurso no TST,
ministro José Roberto Freire Pimenta, embora as normas coletivas devam ser
respeitadas e valorizadas, a jurisprudência do TST, com fundamento no princípio
da dignidade da pessoa humana, vem se consolidando no sentido de que, durante a
suspensão contratual decorrente da invalidez, o empregador não pode sustar a
concessão de benefícios ao trabalhador "justamente no momento de sua maior necessidade, como se o trabalhador
pudesse ser descartado e abandonado à própria sorte porque não apresenta mais
utilidade, tal e qual uma máquina defeituosa e imprestável aos seus fins
lucrativos". Essa orientação está consolidada na Súmula
440, que garante a manutenção de plano de saúde a empregados aposentados
por invalidez. "Na essência, os
fundamentos para a manutenção do auxílio-alimentação são os mesmos da
manutenção do plano de saúde", observa.
O ministro até ressalta que, conforme o
artigo 475 da CLT, o empregado aposentado por invalidez tem suspenso o
contrato de trabalho durante o prazo fixado pelas leis de previdência social.
Porém, "não se pode concluir que
esse evento extirpe do mundo jurídico todos os efeitos decorrentes do contrato
suspenso", sustenta. Será?
Com a devida vênia, a jurisprudência do TST
pode até ter sido sedimentada em súmula e os fundamentos de valores morais e
naturais postos, mas não há embasamento jurídico na conclusão alcançada para o
caso do auxílio-alimentação, bem como não há norma jurídica positiva que embase
a orientação sumular quanto à questão do plano de saúde.
Enquanto durar o período de afastamento do
empregado em benefício previdenciário, todas as obrigações do empregador são
suspensas e inexigíveis, por força de expressa imposição legal, conforme artigos
475 e 476 da CLT e artigo 63 da Lei nº 8.213/91:
Art.
475 da CLT. O empregado que for aposentado por invalidez terá suspenso o seu
contrato de trabalho durante o prazo fixado pelas leis de previdência social
para a efetivação do benefício.
Art.
476 da CLT. Em caso de seguro-doença ou auxílio-enfermidade, o empregado é
considerado em licença não remunerada, durante o prazo desse benefício.
Art.
63 da Lei nº 8.213/91. O segurado empregado em gozo de auxílio-doença será considerado
pela empresa como licenciado.
Além do texto expresso da lei, a doutrina
trabalhista sempre foi uníssona em afirmar que, nas hipóteses de suspensão
contratual na relação empregatícia, o principal efeito decorrente é a sustação
das obrigações recíprocas, exceto em casos de afastamento por doença
profissional, pois há legislação (art. 15, § 5º, da Lei nº 8.036/90) e, permissa venia, razoabilidade na
manutenção das obrigações patronais, pois há nexo de causalidade direto entre
trabalho e mazela, independente de culpa.
Porém, em casos de afastamento por auxílio-doença
ou aposentadoria por invalidez, nos quais não há qualquer relação entre o
trabalho e a doença incapacitante, a manutenção das obrigações patronais é
injusta e, principalmente, ilegal, pois a lei[1]
– e apenas ela! – já determina as consequências de eventual reassunção da
capacidade laborativa do empregado afastado pelo INSS, inclusive na hipótese de
ter sido contratado um empregado substituto.
Assim, sempre com as devidas vênias, o
entendimento sedimentado na Súmula 440 do TST, utilizado para julgamento do
caso concreto acima referido, viola frontalmente o texto da lei, o que
infringe, por consequência inercial inequívoca, a própria Constituição Federal,
que erigiu o império da lei no ordenamento jurídico brasileiro. A jurisprudência
consolidada anteriormente ao atual viés protecionista refletia a tese ora
advogada, justamente com o amparo legal invocado:
Se
não existe o dever da empregadora em arcar com os salários do obreiro durante o
período de suspensão do contrato de trabalho, da mesma forma não pode ser
atribuída a ela a responsabilidade em custear eventual benefício outorgado por
mera liberalidade, como é o caso do plano de saúde, menos ainda obrigação de
ressarcimento pelas despesas médicas e similares contraídas pelo trabalhador,
quanto mais sob pena de multa diária[2].
Como é
sabido, a aposentadoria por invalidez é causa de suspensão do contrato de
trabalho, nos termos do art. 475 da CLT. E durante essa suspensão, as
obrigações contratuais das partes se tornam inexigíveis. Consequentemente, como
bem salientado na decisão de origem, não está a empresa obrigada a assegurar ao
obreiro a manutenção de planos de benefícios, tais como seguro-saúde,
assistência médico-hospitalar, etc., durante o período em que se encontram
suspensos os efeitos do pacto laboral, eis que, nessa hipótese, os direitos do
empregado se limitam àqueles expressamente previstos na legislação[3].
Então, repita-se, nada obstante as inegáveis
razões de cunho moral e humanista, não há fundamento jurídico para a imposição
de responsabilidade às empresas pelo fornecimento de alimentação e saúde para
seus empregados com contratos de trabalho suspensos. Na ordem jurídica pátria,
a saúde e o bem estar são direito do povo, mas um dever do Estado, e não das
pessoas (jurídicas, mas pessoas) que o compõem.
Sendo assim, a regra geral prevista nos
artigos 475 e da CLT e no artigo 63 da Lei nº 8.213/91 deve ser respeitada,
pois vigente e não houve declaração de inconstitucionalidade quanto às suas
cominações. Se não há restrição, portanto, deve ser aplicada a lei de forma integral.
Desse modo, durante o afastamento por benefício
previdenciário não relacionado a doença ou acidente do trabalho, quando o
contrato de trabalho do empregado permanece suspenso, todas as obrigações
patronais restam inexigíveis, inclusive o pagamento de plano de saúde ou
auxílio alimentação aos empregados.
[1] Art. 475 da CLT. § 1º - Recuperando o empregado a capacidade de trabalho e
sendo a aposentadoria cancelada, ser-lhe-á assegurado o direito à função que
ocupava ao tempo da aposentadoria, facultado, porém, ao empregador, o direito
de indenizá-lo por rescisão do contrato de trabalho, nos termos dos arts. 477 e
478, salvo na hipótese de ser ele portador de estabilidade, quando a
indenização deverá ser paga na forma do art. 497. § 2º -
Se o empregador houver admitido substituto para o aposentado, poderá rescindir,
com este, o respectivo contrato de trabalho sem indenização, desde que tenha
havido ciência inequívoca da interinidade ao ser celebrado o contrato.
[2] TRT 5ª Região – RT
00166.2006.461.05.00.5 – Terceira Turma; julgado em 12/09/2006, DOE/BA
20/09/2006, Rel. Des. Sônia Lima França.
[3] TRT 3ª Região – ROPS
00313.2004.088.03.00.2 – Segunda Turma; julgado em 23/11/2004, DOE/MG
25/11/2004, Rel. Des. Antônio Miranda de Mendonça.
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